segunda-feira, 18 de março de 2013

Dia #07- Uma mulher muito magra

Estranhei que fosse tão jovem, que me franzisse o sobrolho e que com uma mão estendida e outra brandindo em direção ao painél, uma espada imaginária, me repetisse várias vezes: il biglieto signorina, il biglieto. Passei-lhe finalmente o bilhete. Que não era para aquele dia, marcava vinte e cinco. Eu sentia-me cansada. Levava num ombro a avó e os seus olhos que não viam, no outro a Amália que me morria de novo a cada minuto que passava, embaraçava-me a máquina fotográfica, a mala, o tripé a tiracolo, e ainda a mochila com uma bolacha e mais meia esperando a minha fome.

Senti uma urgência enorme de descalçar, naquele preciso momento, cada um dos dois chinelos que teimei em calçar naquela manhã. Expliquei que o bilhete tinha sido alterado, mas que não tinha nenhuma via com a data alterada, pensei que o bilhete tinha vindo por carta, mas não o disse. Verificou a lista, e sim, o meu nome constava. Iluminei, finalmente e vitoriosamente, o meu rosto. Mas tinha sido retirado. E de uma maneira que considerei obscena, explicou-me o conceito, para mim até então desconhecido, de over-booking. Todos os lugares já estavam preenchidos, mesmo que conseguisse passar a tempo o portão de embarque, o avião já me tinha dispensado. No meu hipotético lugar imaginei uma mulher muito magra, de galochas e guarda chuva aberto.

(continua)






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