segunda-feira, 25 de março de 2013

Dia #12 - Fuga para o deserto

O rapaz espetou o dedo indicador em direção ao nariz aquilino da mãe, e em alto, e num bom som que toda a vizinhança poderia, um dia mais tarde testemunhar, atirou com um: vou fugir para o deserto, vou ficar lá sozinho, calou-se - a mãe preparava-se para dar meia volta, pensando que a ameaça estava já dita. Enganou-se. E fico lá para sempre, rematou o rapaz, e já batia com os dois pés, furiosa e provocatoriamente no chão, alternadamente. A mãe decidiu não deixar aquele ataque de síndrome do menino Jesus em branco, estendeu-lhe também ela o dedo indicador, mas desta vez um pouco mais abaixo do que ele tinha estendido, e disse: Se vais tu vamos todos, aqui ninguém faz férias sozinho. O caldo estava, à distância daqueles dois indicadores, todo entornado pelo chão. A irmã resolveu entrar na festa, e do quarto, onde só tinha ouvido metade da conversa, apeteceu-lhe fazer esta ilustrada contribuição: Férias? Então há dinheiro para férias, e eu que ando a pedir uns patins há meio ano? Ninguém diz nada agora? A mãe não disse. Ficou a pensar que talvez lhe apetecesse mesmo ir para o deserto,

como se propagaria o som no deserto? Que espécie de miragens teria? Ficou numa tão grande contemplação que o rapaz, que olhava ainda com uns olhos furiosos, ficou desconcertado. Por que raio ela parecia tão calma. Eu vou mesmo! Disse ele, na derradeira tentativa de abalar a imagem que a mãe parecia estar a ver naquele momento. A mãe sentou-se no chão da cozinha, calada, imóvel, feliz. O rapaz resolveu ir chamar a irmã, os dois sentaram-se no chão, comentando. Talvez tivesse enlouquecido de vez. Mãe! Mãe? Silêncio. A mãe saltitava nas dunas, mergulhava na areia, e rodopiava de mãos dadas com os seus dois filhos.



Nota da Editora: Percebemos que é extremamente complicado manter a regularidade da escrita nos fins de semana, procuraremos, na medida do possível, nunca falhar nos dias úteis, até aos 30... nos outros, tentaremos sempre, mas para já sem promessas, nem pessoais. (falar na primeira pessoa do plural dá uma sustentação que esperamos seja verosímil aos estimados leitores, se é que os há)

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